segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

VÉSPERA DE NATAL

Acreditávamos em Papai Noel. Cada um tinha um par de sapatos para colocar à janela. O bom velhinho, de passagem, haveria de deixar presentes.
                   Mas, o Tonico da Rosária (sua avó), além de órfão de mãe, não tinha sapatos. Nunca tivera, jamais experimentara a sensação de calçar-se. O que fazer? Foi onde eram jogados os restos e encontrou uma botina, que molhada pela chuva e ressequida ao sol, entortara-se.
                   Contudo, pensou, São Nicolau não haveria de discriminá-lo, considerando sua pobreza. Voltou para a choupana, colocou a botina na janela. Não sabia escrever, olhou para o céu, contemplou as estrelas, rezou oração ensinada pela mãe, quando aprendera falar. Não sem antes recordar-se dela. Pediu-lhe sua intercessão, entrou e foi dormir.
                   Ele era meu companheirinho de montaria em cavalinho de bambu e tira de morim. Havia falado de suas intenções e me preocupara.
                   Antes que viesse a manhã, revistei meu sapatinho e encontrei, ao seu lado, um cavaquinho, instrumento de quatro cordas. Desci a trilha para a Colônia e fui ter à janela do Tonico. Seu cãozinho abanou-me a cauda e fez festa. Acostumara-se com  minha presença, diária.
                   Pendurei o instrumento num prego do batente e me devolvi à minha casa.
                   Pela manhã, indagou meu pai: “onde está o presente, que o Papai Noel lhe trouxe?” – Errara o endereço e, certamente, fora a outro local, respondi.
                   Quando meu companheirinho chegou tocando o instrumento musical, meu pai entendeu minha boa ação. Calou-se e recomendou, em minha ausência, quando rodeara o presenteado, minha mãe e irmãos nada dissessem.
                   Na manhã seguinte, meu genitor foi à cidade e me trouxe um violão. Encontrara o Bom Velhinho em retirada e este se corrigira do esquecimento.
Tonico teria sido músico noutra existência. Em pouco tempo aprendera a tinir seu presente natalino. Eu nunca passei de ruídos dissonantes.
                   Já moço, fazia o maior sucesso. Quando havia baile na Fazenda, fazia o acompanhamento ao Sabino, exímio toucador de violão, a quem dera o meu.
                   Já mocinho, regalava-me dançando com as caboclinhas ao som das músicas do Sabino e do Tonico.
                   Era tão bom!... Fui, plenamente, compensado, sempre achei que mulher é o melhor presente de Natal.

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